Tieta do Agreste - Jorge Amado

 

Editora: Record

1977 - 592 págs.

Sinopse:Skoob

Minha relação com a história de Tieta vem da novela que foi transmitida na Rede Globo em 1989 quando eu ainda era criança e fiquei impressionada com toda temática. Anos depois vi que minha mãe tinha o livro na estante e decidi que iria ler, mas como a edição era antiga eu sempre adiava a leitura até que em 2020 decidi começar a leitura, mas acabei parando e foi apenas em outubro desse ano que foquei total e li um pouco todos os dias e conclui esse livro que me deixou sem palavras. 

Como esperado os livros costumam ser bem diferente de suas adaptações, mas acredito que nele encontrei muitas reflexões interessantes e críticas a comportamentos sociais bem pontuados. Quando leio um livro assim mais antigo costumo levar em conta a época em que ele foi escrito e todo costume vivido pelo autor. Claro que em alguns momentos pensei, caramba que machismo, que preconceito, que absurdo, que hipocrisia, mas entendi que infelizmente era realidade na época e ainda é em alguns lugares mais remotos do nosso país.

Achei interessante o autor informar que o livro foi lançado no formato de Folhetim, ou seja, em capítulos dentro dos jornais então para isso ele precisava usar algumas técnicas para deixar o leitor curioso para ler o próximo capítulo, além de ter um tipo de conversa com o leitor para explicar quando determinada ação dependia dele ou do personagem, como se ele tivesse vontade própria, achei interessante essas explicações. Mas confesso que quando queria correr com a leitura ela me incomodava no início, mas acabei me acostumando.

Sinopse: "Tieta, ex-pastora de cabras, expulsa de sua terra pelo próprio pai, volta ao lar anos depois. E volta rica, cheia de planos, causando mudanças em sua cidade. Uma história divertida e sensual, que virou novela e filme de sucesso."

Essa sinopse é bem simples e acredito que a maioria de vocês deve lembrar do enredo básico da história. Irei fazendo observações de acordo com o que fui lendo, já deu para perceber que essa será uma resenha bem descompromissada com estrutura, mas focando na minha relação com a história e seus personagens, ok!? Espero que gostem e quem tiver lido ou visto a novela me fala o que achou nos comentários ok!?

É claro que Tieta cresceu sem orientação nenhuma sobre sexualidade e as mudanças normais que acontecem no corpo de uma mulher. Ela cresceu como pastora e passou a observar como os animais se relacionavam e quando seus homônios começaram a se manifestar e seu corpo a se desenvolver, ela começou a chamar a atenção dos homens e perdeu sua virgindade com um mascate que visitava a cidade, depois disso começou a se envolver com o rapaz da cidade e foi denunciada pela irmã ao pai que a expulsou da cidade, como se ela fosse a pior pecadora do mundo. 

Ela narra toda sua trajetória após sair de casa sem nada e sem saber para onde ir e como recomeçou e progrediu financeiramente, passando assim a enviar dinheiro mensalmente para ajudar a família (pensei que ela foi muito superior por fazer isso, já que a família tinha lhe virado as coisas e ela poderia ter morrido). Depois de anos ajudando-os ela para de mandar dinheiro e eles pensam que ela deve ter morrido, mas para surpresa de todos ela chega na cidade e causa uma comoção sem igual. Todos passam a tratá-la como superior e nós leitores entendemos como as pessoas se vendem por ambinção, alguns mais que outros óbvio.

Conhecemos Perpétua e Elisa, meia irmã de Tieta, e descobrimos que ela não é feliz sexualmente com o marido e sonha com a vida das fotonovelas. Ela sonha em se sentir admirada, bonita, desejada (que mulher não sonha ou já sonhou com isso!? compreendi bem Elisa). Elisa relata como as pessoas da cidade reagem quando ela se veste diferente, com as roupas enviadas da cidade grande por sua irmã (percebemos a diferença de mentalidade entre as pessoas de cidade pequena e cidade grande). 

Vários personagens tem destaque e são bem desenvolvidos em 'Tieta do Agreste' e não só a 'Tieta' em si, um deles é a própria cidade de Sant'Ana do Agreste onde podemos acompanhar histórias desde seu nascimento e como ela ficará após a nova partida de Tieta. De uma forma geral, penso que essa foi uma daquelas leituras que simplesmente marcam e ficam inesquecíveis para quem se aventurou por suas páginas, seguindo no fluxo que ela quis lhe levar. Eu poderia falar de muitos outros personagens também marcantes mas essa resenha ficaria enorme. Nos quotes deixarei alguns destacados aqui, espero que gostem.

Eu amei a leitura e quero ler outros livros do Jorge Amado, principalmente os que ele escreveu sobre mulheres e como elas impactaram na sociedade em que viviam aqui detalho um pouco mais sobre meus planos. Seriam esses títulos, além de Tieta: "Gabriela, carvo e canela (1958), Dona flor e seus dois maridos (1966) e Tereza Batista cansada de Guerra (1972)".

<< QUOTES >>

"A menina não tenta inocentar-se. Recusara convites anteriores, o mascate a tinha de olho há tempos. Desta vez agora ela disse vamos, sabendo a que ia. (...) Nas dunas de Mangue Seco, Tieta, pastora de cabras, conheceu o gosto do homem, mistura de mar e suor, de areia e vento." pág.12

"Há males que vêm para o bem, não é mesmo? Se ela não tivesse sido posta no olho da rua, em vez de partir para o sul e triunfar em São Paulo, bem casada, cheia de dinheiro, feliz da vida, teria ficado ali, naquele buraco vegetando na pobreza, sem direito a noivado e casamento pois a história com o caixeiro-viajante logo se tornara de domínio público. Sem direito a nada, mera criada do pai e da madrasta." pág.20

"Antonieta perdoara os agravos, não guardara mágoa, mas não esquecera o passado, não queria maior aproximação com os parentes, gente mesquinha do interior, não desejava misturá-los a seu mundo maravilhoso. Ajudava pai e irmãs como cumpre às filhas quando em boa situação. Obrigação cumprida, a consciência em paz, ponto final: reserva e distância." pág.21

"Por que a gente é assim, Perpétua? Por que a gente não presta? É por isso que ela não quer aproximação, não manda endereço, ajuda de longe." pág.22

"A face pensativa no espelho. Linda de morrer, ali perdida, a envelhecer naquelas ruas paradas, à espera da carta e do cheque. Não fossem o rádio de pilha e as revistas, que seria de Elisa?" pág.25

"Há vinte e três anos na agência dos Correios, Dona Carmosina emite julgamentos definitivos sobre pessoas e fatos. (...) Ela lê os jornais, antes de entregá-los, sabe do que vai pelo mundo, entende de cinema, política, ciência." pág.33

"Falar da vida alheia é a diversão princioal do lugar, grosseria e mau caráter de uns, arte e sutileza de outros." pág.45

"Se ela está dando, dá o que é dela e eu nunca soube que se deitasse com homem por dinheiro, é o corpo que pede. Que pede a ela e a todas, não é mesmo?" pág.48

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